Que a
Academia Brasileira de Letras é uma instituição eminentemente conservadora é
fato do conhecimento geral, mas a censura que fez à conferência de Jorge Coli,
sobre o tema “sexo”, revela que a ABL pauta-se, para além de seu
conservadorismo, por conceitos e práticas medievais diante do que considera
tabu.
Entre as
notícias do portal da ABL, pode-se constatar o informe
sobre a conferência do palestrante convidado Jorge Coli, professor da Unicamp,
intitulada “Sexo não é mais o que era”:
A edição de 2012 do ciclo de conferências Mutações, intitulado “O futuro não é mais o que era”,
continuou na Academia Brasileira de Letras, em setembro [...] Os palestrantes convidados foram o
poeta e ensaísta Antonio Cicero, o crítico de arte e arquitetura Guilherme
Wisnik e o professor da Unicamp, formado
em História da Arte e da Cultura, Arqueologia e História do Cinema na
Universidade de Provença. (Grifo nosso.)
A ABL ainda divulgou
link em que se
encontra a afirmação de que a palestra seria transmitida pela internet, prática
comum da instituição, em se tratando de conferências. Nesse mesmo veículo,
encontra-se um resumo
da palestra de Jorge Coli:
O sexo não é mais o que era: atravessamos uma
fase conservadora e acomodada. William Reich, Allen Ginsberg, o “Summer of
Love” são referências de outras eras, que parecem muito distantes. Porém, na
Internet, explode a pornografia, que domina, de longe, o número de consultas. A
sexualidade, que um dia sonhou-se livre, tornou-se sórdida. Trata-se de uma
interrelação combinada por convenções: a
sexualidade é sórdida porque se opõe aos sentimentos elevados e ao lirismo
erótico. No entanto, a natureza da pornografia abala e faz cair a máscara das
belezas voluptuosas como instrumentos de repressão. Ela adquire, por esta
ótica, força subversiva contra as hipocrisias. Esperamos, torcemos, para que a
pornografia seja o futuro do erotismo.
Contudo,
Jorge Coli fez o seguinte relato do que ocorreu - aqui transcrito com permissão do autor:
Ontem dei uma conferência na Academia
Brasileira de Letras, intitulada: Sexo não é mais o que era. Tratava-se de uma
análise reflexiva sobre as noções de pornografia, erotismo e sexualidade dentro
das artes. Ela sublinhava o caráter conservador do moralismo atual e criticava
os puritanismos repressivos que oprimem o imaginário, e não apenas ele.
A conferência deveria ter sido transmitida via internet. Soube hoje que ela foi censurada, e que essa censura teria vindo por "ordem da diretoria". De início, as imagens que a ilustravam foram suprimidas da transmissão (eu começava com duas obras de Jeff Koons). E, quando citei o trecho de um autor que continha algumas palavras indelicadas (crítica de Philippe Murray ao quadro de Courbet, a Origem do mundo, publicada em 1991 na revista Art Press), a palestra foi interrompida. Ou seja, a ABL ilustrou, de modo preciso, o acerto de minha tese sobre a hipocrisia pudibunda (termo no qual certamente ela ainda censurará as duas últimas sílabas) de nosso tempo.
Não apenas os acadêmicos são imortais: eles também não têm sexo, como os anjos.
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